terça-feira, 13 de dezembro de 2016

A FRUSTRAÇÃO

vem sempre com uma roupinha nova.
ou nem sempre, que é o caso que vou contar.
essa é uma velha conhecida.
mas hoje senti como se a pegasse pelas orelhas,
como um coelho fujão,
um bichinho inábil
e odiosamente querido.
hoje foi o insight totalmente completo de que não se pode falar nada
e ser completamente compreendido.
que a gente fala algo
e não sei se é por que é difícil mesmo,
ou se a arte da escuta está se perdendo (junto com a arte da artesania em bambus e certamente outras artes da quase inutilidade prática e do presente).
mas muitas vezes sinto que entre o falar e o compreender,
90 por cento se perde em camadas de oceano e outros materiais.
hoje só queria dizer algo e ser escutada.
que cada palavra voasse e penetrasse e então descansasse,
mas havia saido da minha boca
e já havia resposta.
e as respostas eram justificativas e motivos e passados,
e tanto fazia,
a unica resposta para aquelas palavras era a escuta,
e não novas palavras.
e então virou ensejo para briga, para ego,
e veio o silêncio,
e sentou-se sorrateiro,
reinando sozinho no seio do desentedimento.

contramão

por onde começar?
talvez pelo corpo, aonde a expressão dessa coisa que é a gente começa ou termina. Lembro que doia. O pé, até o peito, e uma sensação de cansaço fisico, pressão baixa, alheamento. Lembro dos pés em cima das almofadas colocadas num ímpeto carinhoso de desespero (ou desesperado de carinho). As ideias zum zum na cabeça, sem agarrem-se umas as outras afim de fazer sentido. Ai é a coisa em si que quero descrever escapa: não sei se era o ar atascado no fora dos pulmões; se era calor na hora do frio ou vice versa; ouvia as vozes lá embaixo contentes. As vezes quando a tristeza embrutece a alegria vira um dissabor. Que pena, é bem na hora necessária do amor. Mas a alegria que vinha lá de baixo era como a luz que denunciava a sombra numa pintura. E eu ali deitava me debatia sem entender com os contornos gris que a minha emoção se submetia.
Chega. To me perdendo ainda mais. Era isso. Cansaço fundo. Uma cama que não era minha. Alegria vinda lá debaixo. E a sensação complexa da certeza de um fim na contramão do desejo.
Tipo na hora que você tem suas mãozinhas segurando o galho da árvore e você sabe que vai doer, que tem que cair lá embaixo, que não quer cair, e que seguramente seus dedos vão soltar em segundos. É complexo e burro e esperto e profundamente corajoso e solitário e sei lá o que.
Era essa sensação. E não havia mais nada a fazer se não chorar um pouco. compreendendo que não há muito mais do que embarcar na ignorancia desse momento.

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

hoje 2

eu também não chego a entender. não entendo nada. quando a gente fica assim fica meio perdido mesmo. vendo só um décimo de quadro pintado que já é só uma partinha do mundo.
essas horas não tem a ver com um fato ou dois, acho. tem a ver com esse mergulho ao contrário, essa coisa que é pra dentro, mas não é profundo, é mudança, mas não é boa, é ver outra coisa, mas é cegueira. e nessa cegueira a gente fica cego que o que a gente precisa (querer é pouco) é afeto. um afeto restaurador, que dê esperanças, que pelo simples calor comunique que tudo é vento e rio e céu, e Tempo.
mas não tem. em dias assim não tem. em dias assim o lodo, o lixo, o cheiro do dificil, e tudo vai dando um jeito de ficar mais  complicado, como se carregasse tudo para uma grande desilusão, um lixão mesmo, um desmonte. e ali pairando entre todas essas peças de ex - coisas e esse cheiro agridoce tudo parece errado, e ruim, e sem amor.
o amor parece uma história bonita que nos contaram para nos iludir, e dá mais raiva, por que tudo de bom parece filme, ou pros outros, ou mentira para nos arrombar o coração. e quando o afeto aparece, para gente parece mentira, ou mendigo, parece uma criança pedindo esmola no farol, mistura de ternura com alguma outra história que está por baixo da história real. parece impossível de abraçar, mesmo que a ternura pinte, e a gente foge, e se embrenha mais no amontoado.
ai já encontramos mais peças e vamos inventando um mundo inteiro no lixão, e nada ali parece mentira, ou verdade, e as coisas nos enojam e nos encantam, por que de repente parece que por pior que seja o lixão, ele é a nossa unica casa.
ai da a famosa pane entre coração e mente. o coração busca comunicar que precisa desesperadamente de afeto. mas a cabeça tapa. a cabeça tem medo. tem medo das pessoas grandes e brilhantes que aparecem por perto, e o medo cria o medo, o medo que tudo seja mentira, então é melhor se garantir na verdade, e a verdade, a unica verdade, é o lixão.
o coração tenta, uma e outra vez, várias vezes, e topa vez a cabeça tapa, cria um barreira de algodão, ou então veneno mesmo. e a cabeça desencanta o que o coração canta. ai o fluxo vira reverso e gera ódio, e o ódio se espalha que nem verme, que nem bactéria, e o lixão é ótima matéria para esse desencontro. nesse ir e vir de lixo com lixo também batem outras coisinhas, com suas manias de grandeza. o desespero, ansiedade, inveja, o temor.
e quando vimos expulsamos todos os vivos, e somos reis, os verdadeiros reis do lixão, e então a cabeça já está estupida demais para entender por que a sensação não fica boa. não amacia. era uma promessa que a dor da cabeça fazia. promessa vã. e aí o coração já não sabe como falar, não tem voz, não tem clima, como vai arranjar voz o coração com a boca embotada de cinza?